
A cada dia que passa, a famigerada simbiose entre o poder financeiro e o judiciário brasileiro se torna mais evidente, e o caso do Banco Master é apenas mais um capítulo dessa novela sem fim. Não há como olhar para a contratação do escritório da mulher e dos filhos de Alexandre de Moraes sem sentir aquele cheiro característico de conchavo institucionalizado. É incrível como os mesmos nomes circulam pelos mesmos espaços de poder, garantindo que suas relações interpessoais sejam convertidas em influência e vantagens.
O Banco Master, que está negociando a venda de parte de sua operação para o Banco de Brasília (BRB), estatal controlada pelo governo do Distrito Federal, decidiu confiar seus interesses jurídicos ao escritório Barci de Moraes, onde, vejam só, trabalham Viviane Barci de Moraes, esposa do ministro do STF Alexandre de Moraes, e seus dois filhos. Mas, segundo as “fontes”, Viviane representa o banco apenas em algumas ações. Quais? Bom, essa é uma informação que ninguém quer revelar. O banco não diz, o escritório não comenta, e o Supremo Tribunal Federal, onde Moraes reina absoluto, convenientemente não registra o nome de Viviane nesses processos. Afinal, para que transparência quando se tem amigos nos lugares certos?
Mas a situação vai além de simples contratos advocatícios. O Banco Master detém R$ 8,7 bilhões em precatórios, títulos de dívida do poder público, o que significa que depende diretamente de decisões judiciais para garantir que esses valores sejam pagos. Desse total, R$ 8,5 bilhões são “direitos creditórios”, ou seja, ativos que já possuem decisões definitivas favoráveis, mas que ainda aguardam a tão desejada conversão em dinheiro. E quem são os responsáveis por definir o destino de grande parte dessas dívidas? Os tribunais superiores, incluindo o STF, onde Moraes tem peso considerável.
Por mera coincidência, o Banco Master tem um processo ativo no STF, relatado por Gilmar Mendes, outro nome que dispensa apresentações quando o assunto é proximidade com a elite financeira e política do país. Trata-se de um caso envolvendo a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), arquivado por Gilmar, mas que voltou à pauta por meio de um recurso do banco. O que está em jogo? Apenas milhões de reais em tributos que o banco tenta evitar pagar. Mas, claro, tudo dentro da mais perfeita legalidade – aquela legalidade interpretada conforme a conveniência dos envolvidos.
O histórico do Banco Master é um verdadeiro festival de conexões políticas e jurídicas. A instituição tem se destacado por patrocinar eventos jurídicos luxuosos no exterior, onde magistrados brasileiros aparecem como convidados especiais. Em abril de 2024, o banco financiou o I Fórum Jurídico Brasil de Ideias, um encontro realizado no requintado The Peninsula Hotel, em Londres, com diárias superiores a R$ 6 mil. E quem estava presente? Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes e Dias Toffoli. O objetivo do evento? Troca de ideias, claro! Afinal, nada melhor do que um bom vinho europeu para inspirar debates sobre a “independência do Judiciário”.
A proximidade do Banco Master com figuras públicas não se limita ao Judiciário. Em 2023, Ricardo Lewandowski, recém-saído do STF, foi incorporado ao conselho estratégico do banco, com um salário superior a R$ 100 mil mensais. Ao lado dele estavam o ex-presidente do Banco Central Gustavo Loyola e o ex-técnico do BC Geraldo Magela. E, como num passe de mágica, Lewandowski saiu do Master assim que virou ministro da Justiça de Lula. Apenas coincidência, evidentemente.
Outro nome de peso que tem laços com o banco é Guido Mantega, ex-ministro da Fazenda dos governos petistas. O colunista Lauro Jardim revelou que Mantega trabalha para o Master desde o início de 2024 como “consultor estratégico”, uma função bastante abstrata, mas que parece envolver aproximações estratégicas com o governo Lula. Não por acaso, foi Mantega quem levou o dono do banco para uma reunião com Lula no Planalto. Mas, de novo, tudo dentro da mais absoluta normalidade republicana.
O escritório de Viviane Barci de Moraes, localizado no Itaim Bibi, em São Paulo, não é um escritório qualquer. Especializado em direito empresarial, licitações, contratos, recuperação judicial e falências, ele já defendeu causas de interesse de diversas figuras públicas. Um dos clientes é José Auricchio Júnior (PSDB), ex-prefeito de São Caetano do Sul, cassado pelo TSE em 2024. Outra cliente ilustre é a ex-presidente do Banco Rural, Kátia Rabello, condenada no escândalo do mensalão a 16 anos e 8 meses de prisão. Viviane atuou no processo em que Rabello tentava reaver valores de uma antiga distribuidora de combustíveis, caso que foi parar no STF e, por coincidência, acabou devolvido ao Tribunal de Justiça de São Paulo por determinação de Luiz Fux.
Diante desse quadro, a questão que fica é: até quando o Brasil seguirá refém desse tipo de arranjo institucional, onde os interesses de bancos, políticos e magistrados se confundem de forma tão escancarada? A impunidade não está apenas nas decisões judiciais, mas também na forma como essas relações são naturalizadas. O Banco Master não precisa de um advogado qualquer, ele precisa de influência. E o STF não precisa de um magistrado neutro, precisa de articulações. É essa dinâmica que sustenta o sistema há anos e que mantém os mesmos de sempre no topo da cadeia alimentar do Brasil.
Enquanto isso, o cidadão comum, que mal consegue abrir um pequeno negócio sem ser esmagado pela burocracia e pela tributação abusiva, olha para esse cenário e se pergunta: onde está a Justiça para o povo? O país, infelizmente, se tornou um imenso teatro onde os protagonistas são sempre os mesmos, e o público – nós, brasileiros – apenas assiste, impotente, ao desenrolar de mais um espetáculo de privilégios e corrupção disfarçada de legalidade. O Estado de Direito no Brasil, ao que tudo indica, tem donos. E eles não são os cidadãos.
Com informações O Globo