
A viagem de Janja Lula da Silva ao Japão, conforme comunicado oficial do Palácio do Planalto, teria ocorrido sem custos ao erário. Mas qualquer observador atento da política brasileira sabe que, quando um governo precisa repetir inúmeras vezes que algo “não teve custos”, é justamente aí que deve residir o ponto de questionamento.
A primeira-dama teria embarcado em um avião da Força Aérea Brasileira (FAB) junto com a equipe precursora, um grupo técnico responsável por preparar a chegada do presidente da República. No papel, tudo parece dentro da normalidade institucional. No entanto, a questão de fundo não é o simples deslocamento, mas a forma como essa presença se desenrola nos bastidores do poder. Janja não é apenas a esposa de Lula; ela é um ator político relevante dentro deste governo. Seu protagonismo, que se estende desde os bastidores da campanha até os palcos da política externa, levanta uma série de dúvidas sobre a real natureza de sua participação na estrutura decisória do governo petista.
Curiosamente, Janja desembarcou em Tóquio uma semana antes de Lula. Nenhuma explicação convincente foi dada sobre a necessidade dessa antecipação. A justificativa oficial, segundo sua equipe, é que ela foi junto à equipe precursora para “economizar passagem aérea”. Em um governo que prega transparência e compromisso com os gastos públicos, essa é uma desculpa que não resiste a um escrutínio mínimo. Afinal, há diferença entre um deslocamento técnico de profissionais do governo e uma presença política influente, que tem se mostrado cada vez mais evidente no comportamento da primeira-dama.
Na edição do Diário Oficial da União (DOU) de 1º de abril de 2025, Janja apareceu como o primeiro nome na lista dos 23 integrantes da comitiva presidencial, acompanhada da rubrica “sem ônus”. Ao lado dela, apenas o embaixador do Brasil no Japão, Octávio Henrique Côrtes, recebeu essa mesma designação. Todos os demais, incluindo ministros e representantes de órgãos governamentais, estavam claramente listados com suas respectivas responsabilidades orçamentárias. A pergunta inevitável é: seria apenas uma conveniência administrativa ou há algo mais obscuro nesse mecanismo de classificação de custos?
A oposição, como esperado, não deixou passar a oportunidade de criticar a presença de Janja. Desde o início do governo, há um incômodo crescente com o protagonismo da primeira-dama e, sobretudo, com os custos de sua equipe. Em 2023 e 2024, segundo levantamentos independentes, os assessores designados para atendê-la custaram aproximadamente R$ 1,9 milhão por ano. Um montante considerável para alguém que, oficialmente, não ocupa cargo público nem tem um gabinete formal dentro da administração federal.
A resposta do governo a essas críticas seguiu a cartilha petista: minimizar as alegações e atribuir tudo a uma suposta perseguição política da oposição e da imprensa não alinhada. Lula, ao ser questionado sobre o tema, foi enfático: “Janja não é clandestina e vai continuar fazendo o que ela gosta”. A frase não poderia ser mais reveladora. Mais do que um gesto de defesa conjugal, essa declaração indica que o presidente vê sua esposa como uma peça fundamental no governo, algo que, evidentemente, não é compartilhado por grande parte da população.
Esse protagonismo político de Janja levanta questões profundas sobre os limites entre o papel institucional de um chefe de Estado e as influências informais que permeiam o Palácio do Planalto. Seria este o governo de Luiz Inácio Lula da Silva ou o governo de Lula e Janja? A ascensão da primeira-dama como figura pública vai muito além do convencional. Se compararmos sua atuação com a de primeiras-damas anteriores, mesmo em governos do PT, nenhuma delas desfrutou de tamanha centralidade no processo político.
A participação de Janja em viagens internacionais e eventos de alto nível não pode ser simplesmente ignorada como um detalhe protocolar. Existe um custo implícito na sua presença — seja no uso de aeronaves oficiais, na ocupação de espaços de representação ou mesmo na influência política que ela exerce dentro do governo. E é exatamente esse custo que deveria ser melhor esclarecido.
O que se vê, no entanto, é um governo que prefere se blindar atrás de narrativas artificiais de “transparência”, enquanto subestima a inteligência do eleitorado. O brasileiro comum, que luta diariamente para pagar suas contas, tem o direito de saber por que a esposa do presidente tem um papel tão ativo, embora não oficialmente nomeado, dentro da máquina pública.
A viagem ao Japão, assim como tantas outras questões envolvendo Janja, mostra como o petismo transformou o governo em um feudo particular, onde alianças políticas e influências pessoais se sobrepõem à estrutura institucional do Estado. O Brasil precisa urgentemente de uma imprensa mais combativa, disposta a expor os bastidores do poder sem medo de retaliações. Pois se há algo que a história nos ensina é que, quando o governo precisa insistir que algo é “sem custos”, provavelmente o preço já foi pago — e quem pagou, como sempre, foi o povo brasileiro.
Com informações Poder 360