
O recente pronunciamento do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em Paris, revela mais um capítulo da eterna novela entre Mercosul e União Europeia, onde a realidade se confunde com utopia e interesses políticos se sobrepõem à lógica econômica. Em sua fala na Sciences Po, Haddad defendeu que a União Europeia deveria enxergar o acordo comercial com o Mercosul sob uma perspectiva política, e não apenas econômica. O que isso significa? Que o Brasil deve se sujeitar a um tratado que traz “poucas vantagens econômicas”, mas que tem um suposto valor político? Essa é a linha de raciocínio de um governo que, ironicamente, se vende como defensor dos interesses nacionais.
Vamos aos fatos. O acordo entre Mercosul e União Europeia foi anunciado com pompa e circunstância, mas encontra obstáculos dentro do próprio bloco europeu, especialmente em países como França e Itália, que não veem com bons olhos a abertura de seus mercados para produtos sul-americanos. E faz sentido: por que nações europeias abririam mão de sua produção interna para favorecer exportações de países que não impõem as mesmas rigorosas normas ambientais e trabalhistas? Para os europeus, aceitar esse acordo sem resistência seria um suicídio comercial. Já para Haddad e sua turma, o importante é forçar um casamento de interesses, ainda que o Brasil entre nele como coadjuvante.
Haddad insiste que o valor do acordo está na sua relevância geopolítica. Ele argumenta que esse tratado pode ser uma alternativa a um mundo bipolar, em referência à crescente polarização entre Estados Unidos e China. Mas há um problema fundamental nessa tese: a União Europeia nunca se apresentou como um bloco economicamente independente. Seu comércio está profundamente entrelaçado com os Estados Unidos e, nos últimos anos, também com a China. A ideia de que um tratado com o Mercosul poderia reposicionar a UE como um polo isolado é uma fantasia conveniente para aqueles que desejam vender ao Brasil o sonho de uma parceria estratégica que, na prática, não favorece o país.
Outro ponto de sua fala merece atenção: Haddad menciona o compromisso do Ministério da Fazenda com a COP30, a conferência climática que será realizada no Brasil em novembro. Esse trecho, aparentemente desconectado do tema do acordo comercial, revela um aspecto essencial da narrativa petista: atrelar acordos econômicos a questões climáticas e ambientais. O problema dessa estratégia é que, enquanto o Brasil assume obrigações ambientais cada vez mais rigorosas, países desenvolvidos continuam adotando práticas muito mais flexíveis. Esse desequilíbrio cria um cenário onde a indústria e o agronegócio brasileiros correm o risco de sofrer sanções e restrições comerciais baseadas em critérios subjetivos, enquanto concorrentes internacionais se beneficiam dessa hipocrisia regulatória.
O ministro tenta vender a ideia de que o Brasil e o Mercosul estão no mesmo nível de negociação que a União Europeia. Mas essa visão ignora a realidade: o bloco sul-americano não tem o mesmo poder de barganha. O que se vê, na prática, é uma tentativa de forçar um alinhamento artificial, que pouco beneficia o Brasil em termos concretos. E o pior: ao insistir que a União Europeia deve priorizar o caráter político do acordo, Haddad escancara a real intenção do governo Lula – usar esse tratado como um troféu diplomático, mesmo que isso signifique sacrificar interesses econômicos brasileiros.
Olhando para a história, não é difícil perceber que esse tipo de postura não é novidade. Sempre que governos alinhados à esquerda assumem o poder no Brasil, o discurso se torna menos pragmático e mais ideológico. Ao invés de lutar por termos mais vantajosos para o Brasil, a estratégia se resume a fazer concessões em nome de uma suposta “solidariedade internacional”. Mas qual o preço disso? Um país que abre mão de seus interesses em nome de um alinhamento político acaba se tornando refém de decisões tomadas por potências estrangeiras.
Se há algo que o Brasil precisa aprender com essa negociação é que tratados comerciais não são plataformas para discursos políticos vazios. São ferramentas estratégicas para fortalecer a economia e garantir desenvolvimento. O Brasil deveria buscar acordos que tragam vantagens concretas para exportadores, empresários e trabalhadores brasileiros, em vez de simplesmente servir como peça de propaganda para o governo de turno. Mas enquanto nossa diplomacia seguir priorizando ideologia em vez de pragmatismo, continuaremos a ser figurantes no cenário global, assistindo de longe enquanto as verdadeiras potências moldam o mundo ao seu favor.
Com informações Reuters